E se ensinássemos o futuro? Por Luis Rasquilha
Porque continuamos a formar alunos para um mundo que já não existe?
Vivemos em plena era da mudança, onde tudo à nossa volta — tecnologia, ambiente, sociedade, trabalho — está em constante transformação. E, no entanto, as escolas e universidades continuam a ensinar como se o mundo estivesse parado. Continuamos a ensinar História (e bem!), mas esquecemo-nos de ensinar Futuro. E isso tem um custo.
Ensinar o passado é importante: ajuda-nos a compreender de onde vimos, a aprender com os erros, a valorizar conquistas. Mas, quando esse é o foco quase exclusivo da educação, formamos mentes treinadas para analisar o que já foi — não o que pode vir a ser. E essa miopia pode ser fatal num mundo onde os desafios do amanhã exigem soluções que ainda nem existem hoje.
Foresight — ou pensamento de futuro — é a disciplina que estuda tendências, sinais emergentes, possíveis cenários e disrupções. Não se trata de prever com exatidão, mas de preparar para possibilidades. É uma competência estratégica, aplicada em governos, empresas e organizações de vanguarda. Mas raramente entra nas salas de aula.
Por que razão não ensinamos crianças a pensar no que o mundo pode ser em 2035? Por que não desafiamos os jovens do ensino secundário a imaginar os empregos que ainda não foram inventados? Por que os estudantes universitários não aprendem a mapear tendências, analisar sinais de mudança ou projetar soluções para futuros sustentáveis?
A verdade é que o sistema educativo está mais preocupado em certificar do que em preparar. Em manter do que em transformar. Em repetir do que em imaginar. Em preparar para o saber-fazer em vez de preparar para o saber-pensar.
Ferramentas de Estudo do Futuro que poderiam ser ensinadas:
- Análise de Tendências: Identificar padrões emergentes em tecnologia, sociedade, economia, ambiente ou comportamento humano.
- Deteção de Sinais Fracos: Observar pequenas mudanças que podem indicar grandes disrupções futuras.
- Construção de Cenários: Criar narrativas plausíveis sobre como o mundo pode evoluir em diferentes direções.
- Backcasting: Definir um futuro desejado e pensar estrategicamente para trás, até ao presente, para descobrir como lá chegar.
- Futures Wheels (Rodas do Futuro): Mapear os impactos em cadeia de uma inovação ou acontecimento.
- Design de Futuros (Speculative Design): Usar a criatividade e o design para imaginar objetos, serviços ou sociedades futuras.
- Matrixes de Impacto/Probabilidade: Classificar tendências e riscos segundo seu potencial de impacto e probabilidade de ocorrência.
Exemplos práticos de como isso poderia ser aplicado:
- No ensino básico: Um projeto onde os alunos criam histórias ilustradas de como será a sua cidade em 2050, considerando mudanças climáticas e tecnologia.
- No ensino secundário: Um trabalho interdisciplinar onde grupos simulam o funcionamento de um país em 2040 — sistema de saúde, educação, mobilidade, alimentação, energia.
- No ensino superior: Módulos em cursos de gestão, engenharia ou ciências sociais onde os alunos constroem cenários de futuro para o setor em que vão atuar, integrando tendências geopolíticas, tecnológicas e sociais.
Tudo isto pode ser feito com ferramentas simples, orientadas por professores capacitados, com recurso a metodologias ativas como por exemplo project-based learning, gamificação, design thinking e aulas abertas com profissionais do mercado.
Ensinar o futuro não significa abandonar o passado — significa dar contexto. Significa dar aos alunos ferramentas para navegar na incerteza, adaptarem-se à mudança e liderarem com visão. Significa formar cidadãos ativos, profissionais inovadores, empreendedores sociais. Significa tornar a educação um verdadeiro motor de antecipação e não apenas um espelho retrovisor.
Claro que mudar não é fácil. As universidades ainda estão presas a currículos fixos, disciplinas compartimentadas e modelos ultrapassados de avaliação. Falta formação aos docentes, falta coragem institucional, falta visão. Mas o preço da inação será pago pelas próximas gerações.
Está na hora de incorporar o futuro na sala de aula. Com projetos de foresight, com desafios de inovação, com perguntas abertas e sem resposta. Porque o verdadeiro papel da educação não é apenas ensinar o que foi — é preparar para o que ainda pode ser.
E isso começa com uma decisão simples: deixar de ensinar apenas o que sabemos… e começar a explorar com os alunos tudo aquilo que ainda podemos descobrir.